quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Sobre ficar bem, fracassos e tentar.

"Um dia eu vou ficar bem."
Era nisso que ela pensava, era nisso em que ela queria acreditar com força. Que um dia ela ficaria bem da falta de dinheiro, da falta de certeza, daquele seu grande amor que partiu. Ela não só queria, como precisava ficar bem também porque tudo isso doía. Não essa dor de três letras que todo mundo diz que sente, mas sim aquela dor que faz o peito esmagar, se surrar todo levando-o quase ao tamanho de um mísero grão de arroz. Uma dor sufocante, inquietante, que a fazia apenas sobreviver no limbo dos dias ao invés de viver de fato, transformando-a em um semi-robô no piloto automático.
Era algo do qual ela necessitava: ficar bem. O problema, é que ela não conseguia se lembrar se alguum dia já estivera bem, mesmo fazendo um enorme esforço, ela não conseguia obter resposta alguma. Era como se tudo fosse uma grande bosta desde que ela conseguia se lembrar. E ela sabia que a vida tinha algo de bonito por aí, que havia cores e um mundo inteiro afora para explorar, ela só não conseguia ver as coisas acontecendo para ela. Pelo menos não de verdade. A começar pelas pessoas: elas sempre a deixavam, conseguiam o que queriam e iam embora. Lhe causavam expectativas, alimentavam suas mais dóceis ilusões para depois decepcioná-la e abandoná-la a mercê de um barco à deriva prestes a naufragar, que era a sua vida. Ninguém nunca a quis de verdade. Nem seus pais, - ela sempre foi um erro e ela sabia - nem aquele amor que ela achava que só existia nos filmes quando finalmente o encontrou. Encontrou e constatou que amar era real. Achou que teve sorte uma vez na vida e realmente teve, mas não por muito tempo. Do nada veio as desculpas e mais do nada ainda sua partida. Deve ter encontrado algo melhor e a trocou. Assim, de repente num vapt-vupt fatal. Talvez até ela mesma em algum momento da vida teria se trocado também. Mas ela era boa em amar não era? Só não era boa em ser amada.
Se sentia inútil na maior parte do tempo mesmo tendo dentro de si uma vontade enorme de crescer, mas parecia que nada dava certo para ela. As coisas não aconteciam. Para ela e mais uns milhões de pessoas espalhadas pelo mundo, com problemas bem maiores dos que o dela. Ela sabia. Mas isso nunca fez as coisas serem menos duras ou difíceis. Outro problema que a incomodava constantemente era a falta de grana. Pensava que poderia muito bem sentir e passar por todas essas coisas sim, mas que seria bem melhor sofrer em Paris bebendo champanhe, do que aqui nesse apartamentozinho que nem dela é, no centro de cidade. O mundo era um redemoinho faminto e a devorava. Ela também tinha fome, queria devorá-lo também. Mas o que uma garota de quase 20 e pouquinhos anos poderia fazer a um mundo tão grande? "Recolher-se a sua insignificância, é claro" ela pensou. E foi o que fez. Parou de ter pena de si por um instante, guardou sua bebida no armário da pequena sala, deixou os restos de cigarro no cinzeiro na mesa ao lado e deitou-se em sua cama. Adormeceu rápido pensando que amanhã era sempre um novo dia. Mesmo que fosse para fracassar de novo... Ela podia sempre tentar, não podia?

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